Quando se fala em devassa da nossa vida privada, surge logo como coisa boa, a segurança. Para que se saiba: os países mais seguros foram (e são) aqueles que estiveram sob regimes de ferozes ditaduras. Escuso de nomear.
E a internet parece preencher esta capacidade do ser humano, quando se posiciona num estado de conforto (as necessidades básicas estão preenchidas), pede logo a segurança (a liberdade é um coisa básica, está preenchida, pois então dela não precisamos). Com este instrumento, não nos preocupamos por ser vigiados, desde que saibamos que o criminoso está a ser vigiado. É uma troca que tem um preço que as sociedades modernas parecem dispostas a pagar - apesar de, no passado, numa sociedade que apresentava moldes idênticos a esta do início do século XX, esse preço ter sido cobrado e de que forma. Desta forma damos um pouco de liberdade por um pedaço de segurança.
A dificuldade está em encontrar esse equilíbrio. A internet dá-nos a falsa ideia de tudo estar devidamente sopesado. A quantidade de informação que ali está disponível, dá-nos a sensação que poderemos saber tudo o que é preciso para que o valor do nosso bem – estar esteja globalmente equilibrado. Assim: da segurança, ficamos satisfeitos ao saber que um (saliento o um) criminoso foi detido; da nossa liberdade não nos importamos que a Google nos siga através do nosso telemóvel, ou que o facebook nos exponha as conversas. Enfim, uma troca.
E estamos dispostos a fazê-la? Assim? E achamos que somos poderosos? É natural, e qualquer político sabe-o, que a chegada ao poder exige pagamentos, muitas das vezes penosos, mas que é que isso significa se tal esforço, tal compromisso e dor nos pode proporcionar poder? E por uma conversa amena com um(a) desconhecido(a) através do teclado, também estamos dispostos a penas idênticas?
A construção da aldeia pode ser uma coisa boa, quando vista do lá de cá, da cidade. Não conheço ninguém que de lá não tenha fugido, a menos que se isole como numa cidade (é engraçado ver aqueles numerosos nórdicos, tipicamente alemães da geração de finais sessenta, que se refugiam e escondem nas aldeias abandonadas de Portugal…). A internet prende-nos, por ter e por não ter cão. Por vezes penso que deveria ter alguma vergonha por não frequentar o facebook, o twiter, o linkedin... estranho, pois provoca um sentimento de perda, como se estivesse algo ali de importante e que me está a passar despercebido. Às vezes penso assim. Outras, que não me apetece estar com as pessoas desta forma, através de um fio. Faltam sentidos a esta coisa, sentidos e sentidos de sensações físicas, falta o cheiro e o paladar, falta o tacto, ao som falta coerência e à visão falta dimensão. E isto, sem dúvida, que nos torna incompletos.
Nada tenho contra a tecnologia, eu vivo a partir dela e com ela , mas deve completar o ser humano, não diminuí-lo. Devemos ser exigentes. De facto a Internet tornou-nos poderosos, mas o poder para ser bom (positivo, coerente, diversificado, múltiplo, equilibrado, com senso e suporte), tem que ter sabedoria. Mas não me parece que ela abunde, pois a rapidez de construção mental prolífera, sentimo-nos sapientes não por determos o conhecimento, mas sim, por saber que ele está ali, ao sabor de um clic. Se precisar eu vou lá. E depois, isso porventura significa de que sou capaz de o interpretar? Saberei reconhecer o que é a verdade de uma armadilha? Saberei ler e estudar de forma completa o assunto para o qual tenho que me precaver? Parece-me que não, lamento. Basta ver a televisão e ler os fóruns de discussão generalistas, sejam eles quais forem. A discussão é sempre pela rama, é sempre mais emocional e raramente é construída ou sustentada.
De facto, nesta aldeia, somos mais poderosos, mas pouco mais somos, para além da tecnologia, do que a massa de humanos cheios daqueles sentidos básicos que povoavam aquela era, à qual chamamos idade média.
Caro colega,
ResponderEliminarO teu depoimento pessoal tocou-me muito porque também eu sinto como tu mas nunca o tinha conseguido expressar.
Quando falamos de empresas diz-se muitas vezes que quem não tem presença na internet não existe.
Mas no fundo vamos muito mais além, sentimos muitas vezes que quem não está na rede, não existe. E de facto se não temos uma quinta no Farmville, ou um perfil no Facebook, ou uma rede de contactos no Linkedin ou outra moda qualquer que ainda não foi inventada, sentimos que estamos de fora e que não fazemos parte do Mundo-Grupo-Rede.
E talvez a nossa ligação ao Mundo, na forma de o entender e percepcionar também passe por aqui e por estar na Rede. Embora a parte da Quinta..., não faça nenhum sentido. Cultivar nada, no meio do nada e para nada!
E talvez por pensar que quero continuar a entender o Mundo e para mim isso também passe por estar na Rede, lá estou, até porque tenho dois filhos que pertencem à geração NET "nascidos e criados" no meio da internet, das redes sociais, dos perfis, das quintas e dos grupos on-line, pelo que ou me juntava a eles, ou iam sem mim.... e eu quis ir com eles.
Dina Cunha