Segundo uma notícia da Globo, no passado dia 30 de Março, o jornal britânico "The Times" anunciou que deixará de publicar notícias em tempo real no seu site e aplicações. As atualizações dos conteúdos serão feitas 3 vezes por dia durante a semana e 2 vezes ao dia durante o fim de semana.
Ainda segundo o próprio jornal, esta e outras mudanças que têm sido feitas (como ter os conteúdos digitais disponíveis mediante pagamento) foram "baseadas numa pesquisa exaustiva" sobre os hábitos dos leitores.
Em carta aberta aos leitores, o jornal explica que esta medida foi tomada para oferecer "artigos confiáveis e em profundidade, análises atualizadas e opiniões estimulantes". No entanto, as chamadas grandes notícias de "última hora" não serão afetadas: "Certamente, se houver uma grande notícia, atualizaremos imediatamente".
Aparentemente, estas medidas vão contra tudo aquilo que tem sido dito sobre aquele que é o comportamento atual dos consumidores na internet, principalmente no que diz respeito à informação: a maior parte dos utlizadores tomam como garantido os conteúdos gratuitos e têm cada vez mais interesse no imediatismo, ao serem mais exigentes quanto à presença de conteúdos: querem saber tudo e "agora".
Apesar de ser uma característica apreciada, não são raros os casos em que o imediatismo leva a uma perda do rigor e da qualidade, uma vez que nem sempre se confirmam factos importantes: basta pensarmos no caso recente da morte de um estudante nas instalações da FEUP e das notícias publicadas pela TVI24 relativamente ao mesmo (ver imagens abaixo).
A isto devemos também acrescentar o impacto da partilha das notícias nas redes sociais e os comentários, por exemplo, que muitas vezes acabam por alimentar a divulgação de uma informação falsa/pouco rigorosa.
Notícia da TVI24 publicada a 1 de abril (às 10h11) - http://www.tvi24.iol.pt/sociedade/homicidio/estudante-universitario-mortalmente-espancado-no-porto
Notícia da TVI24 publicada a 1 de abril (às 17h16) - http://www.tvi24.iol.pt/sociedade/feup/pj-afasta-tese-de-homicidio-no-caso-do-estudante-morto-no-porto
Será que com estas medidas o "The Times" estará a dissociar a informação rigorosa do "gratuito"? Conseguirá valorizar os seus conteúdos ao torná-los menos imediatos ou estas decisões terão sido um tiro no pé?
Com o impacto das tecnologias e da internet nas empresas e no comportamento dos consumidores, serão opções como estas que irão garantir a sustentabilidade dos órgãos de comunicação social?
Fontes:
- Globo (http://g1.globo.com/economia/midia-e-marketing/noticia/2016/03/jornal-britanico-times-deixa-de-publicar-noticias-em-tempo-real-no-site.html);
- TVI24 (links mencionados acima)
Olá Maria Manuel! Julgo que a lógica do The Times é de se diferenciar ao oferecer conteúdos de maior qualidade que alguns consumidores valorizarão, em constraste com os soundbytes de muitos como a TVI24. Esses conteúdos poderão inclusivamente ter acesso pago, p.e. via assinatura. Será provavelmente um nicho de consumidores, mas poderá ser essa diferenciação que garantirá o futuro dos media tradicionais, face à concorrência do Google e outros motores de busca, que são quem mais se aproveita do trabalho feito pelos jornais. O modelo poderá ser sustentável se conjugado por exemplo com receitas de publicidade. Os jornais podem cada vez menos ser de papel, mas a qualidade noticiosa não deve ser comprometida pela necessidade constante de imediatismo...
ResponderEliminarOlá professora, não será também para evitar que situações como aquela que a Maria Manuel apresenta em cima relativamente ao estudante que faleceu ao lado da FEP?
EliminarA apresentação de noticias erradas e que informam os consumidores criando uma imagem que nada tem a ver com a realidade parece-me ser algo muito sério. Cultiva o medo, a falta de capacidade de julgamento e a crença de que os jornais e televisões podem apresentar noticias erradas e depois desmentir. Coisa que na minha opinião deveria ser punida.
Maria, é perfeitamente compreensível que o «The Times» assuma esta posição. Agora com a internet e as novas tecnologias, a criação de informação é ao minuto... para não mencionar segundo! Qualquer um pode publicar, qualquer pode dizer o que quiser sem se basear em fontes de informação credíveis. Gosto da ideia do The Times, transmite segurança que as informações partilhadas serão reais e fidedignas. Será um bom posicionamento? Não sei, pois podem perder volume de negócio pelo simples facto que a concorrência publica ao minuto.
ResponderEliminarBoa tarde a todos!
ResponderEliminarPenso que a professora toca num ponto central: provavelmente será um nicho de consumidores que estará disposto a pagar para obter informações de qualidade e que poderá sustentar os órgãos de comunicação social. No entanto, para que esse comportamento se estenda ao resto dos consumidores, terá de haver uma mudança na maneira como o serviço que os jornais prestam é encarado. O fenómeno do "gratuito" ao qual estes aderiram fez com que as pessoas olhem para a informação como algo garantido. Infelizmente, o que muitas vezes verificamos é que a dependência da publicidade (a base das receitas de inúmeros serviços/plataformas gratuitos) acaba por afetar a qualidade das notícias. Ainda que estejam muito acessíveis, estas acabam por deixar de ser interessantes ou até mesmo verdadeiras. Quem conseguir diferenciar-se desse fenómeno e conseguir oferecer notícias de qualidade, conseguirá uma vantagem competitiva importante.